ESCOLA POSITIVA
Em contrapartida com a escola clássica, a Escola Positiva ou, Histórica, resgata os direitos da sociedade em detrimento ao individualismo exacerbado. O foco passa a ser a realidade e, não mais, a razão.
Neste horizonte histórico e sob novos pressupostos ideológicos e teóricos, a crítica do positivismo ao classicismo é centrada, visivelmente, em duas grandes dicotomias: individual x social e razão x realidade (racionalismo x empirismo).
A escola está inserida num momento histórico de grandes mudanças nas funções do Estado que direcionavam para o intervencionismo na ordem econômica e social, sob o foco de novas ordens políticas de cunho social; crise do modelo clássico no combate ao crime.
O delito era reconduzido, pela Escola positiva, a uma percepção determinista da realidade em que o homem está introduzido, e da qual todo o seu comportamento é, no fim das contas, expressão.
A defesa dos Direitos Humanos,protagonizada pelo classicismo, era denunciada como individualismo exacerbado, pelo conseqüente esquecimento da defesa da sociedade. A Escola Positiva assumia, então, a tarefa de resgatar o “social” e os delitos da sociedade.
Simultaneamente, a abstração do sistema clássico, decorrente do método empregado, era posta em cheque, e a escola Positiva assumia a simultânea tarefa de descolar a problemática penal do plano da razão para o plano da realidade; de uma orientação filosófica para uma orientação cientifica, empírico-positiva, a única apta a resgatar aquele segundo personagem “esquecido” pela Escola Clássica: o homem delinquente.
A reação ao conceito abstrato de indivíduo leva a Escola Positiva a afirmar a exigência de uma compreensão do delito que não se prenda à tese indemonstrável de uma razão espontânea mediante um ato de livre vontade, mas procure encontrar todo o complexo das causas na totalidade biológica e psicológica do indivíduo, e na totalidade social que determina a vida do indivíduo.
Os representantes da Escola Positiva negavam o livre arbítrio, sustentando que o ser humano é determinado antropológica (Cesare Lombroso), psicológica (Raphaele Garófalo) ou sociologicamente (Enrico Ferri), de modo que um ou mais desses fatores é que o leva à prática de crimes.
Quanto à pena, viam-na como forma de defesa social, sendo seu objetivo primário a neutralização do delinqüente, e a meta secundária a recuperação co-ativa do delinqüente. Sobre a pena, escreve Vera Regina Pereira de Andrade que:
Nestas condições, se o homem está fatalmente determinado a cometer crimes, a sociedade está igualmente determnada – através do Estado – a reagir em defesa de sua própria conservação, como qualquer outro orgnismo vivo, contra os ataques às suas condições normais de existência. A pena é, pois, um meio de defesa social. Contudo na defesa da sociedade contra a criminalidade, a prevenção deve ocupar o lugar central, porque muito mais eficaz do que a repressão.
Daí Ferri ter preconizado os chamados “substitutivos penais” vistos como um conjunto de providências consistentes em reformas práticas de ordem educativa, familiar, econômica, administrativa, política e também jurídica (de Direito Privado e Público), destinadas a atuar na eliminação ou atenuação das suas causas.
Com o positivismo penal, a pena perde, portanto, o seu tradicional significado retributivo, para assumir um significado preventivo.
Da Escola Positiva emerge a delimitação de um “Direito Penal do autor” fundamentado no determinismo e na responsabilidade social, no qual o potencial de periculosidade social constitui a medida da pena e a justifica como instrumento de defesa social, devendo a pena ser individualizada conforme a personalidade do criminoso.
O desenvolvimento da Escola positiva levará a acentuar as características do delito como elemento sintomático da personalidade do autor, dirigindo sobre tal elemento a análise para o tratamento adequado. Se não é possível imputar o delito ao ato livre e não-condicionado de uma vontade, contudo é possível referi-lo ao comportamento de um indivíduo; isto explica a necessidade de reação da sociedade em face de quem cometeu um delito.
Nesse período, o direito penal liberal passa a receber uma justificação social, em que convivem o discurso de garantia do indivíduo com o discurso da defesa social.
É fundamental salientar, contudo, que da mesma forma que o Estado intervencionista não implica o abandono da estrutura institucional e discursiva do Estado de Direito (e de uma “legitimação pela legalidade”) o Direito Penal intervencionista não implica o abandono discursivo do Direito Penal do Fato. Daí o espaço para um Direito Penal de conciliação que, não podendo abandonar as garantias penais liberais passa a requerer, não obstante paradoxos encetados a nível legislativo, uma intervenção sobre a “personalidade perigosa” do delinquente, com medidas curativas, em nome da defesa social.